Olhando aquele retrato mal consigo conter a emoção. Dói a alma ao ver aqueles campos desertos. São caminhos que percorri que não são mais os mesmos. Hoje estão quase impenetráveis e a desertificação é cada vez mais visível. Encontrei-me com o passado e a nostalgia ataca-me forte. A saudade dói e, por momentos, aquele local parece ganhar vida.
Vejo-me a rabujar pelas topadas nas penedas e pelas ervas da beira do caminho que me mordem as pernas, na descida a caminho do pontão da ribeira, Do outro lado da ribeira aguarda-me uma penosa subida, numas escaleiras rasgadas numa fraga de xisto. Atrás de mim, a tia Leonilde incentiva-me carinhosamente. Avisto já o Coberto e o ti Gaspar sentado à porta da palheira, com uma malga de café sobre os joelhos e um naco de broa na mão. Damos-lhe a salvação e continuamos o nosso percurso. Uns longos metros após a subida, já avisto a tia Delfina junto à palheira e o ti Zé Miguel com o seu rebanho.
A visão das pessoas dá-me mais alento e prossigo, saltando sobre os montes de borralho,
levantando uma nuvem de pó à minha volta. Lá está a tia Assunção com os filhos,
no meio do milho aproveitando as poucas horas de rega. A minha tia já vai a chegar e, daí a nada,
corta-lhe a água.
Na Feiteira, do outro lado da ribeira, lá está o ti
Cristiano a pôr o mato no curral das cabras, enquanto a Marquitas, a Isabel e a
Natividade brincam com os chibitos.
Já avisto o Cabeço e oiço a tia Silvina a falar.
Rapidamente, desço o caminho para a palheira, seguindo o cheirinho a café que a minha avó
está a fazer. A tia Silvina chama-me. Quer saber notícias dos meus pais e dá-me notícias do Sobral Gordo. Entro na
palheira, onde o meu avô já está com o
leitinho acabado de ordenhar, para juntar ao meu café.
Sinto-lhe o cheiro, mas o retrato continua ali, sem vida a
mostrar-me a verdade nua e crua e, uma lágrima teimosa encontra caminho e escapa
pelo meu rosto abaixo.
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