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terça-feira, 20 de novembro de 2012

Por detrás da vidraça...


Acordei num daqueles dias meios encobertos e frios em que a preguiça, tomou conta de mim. Fiquei junto à janela, no silêncio de casa, espreitando pelas vidraças. Deixei os meus pensamentos partir em busca das minhas mais doces recordações. Logo a saudade me veio fazer companhia. Sim, porque nestas alturas, a saudade é sempre  boa companheira duma alma nostálgica, sonhadora e sensível.
Percorro os caminhos do meu passado e vejo-me na minha infância.
Não tinha computadores, nem televisão, nem brinquedos ou jogos. Tudo tinha que ser inventado. Na Ribeira Mourísia, na fazenda dos meus avós, não tinha outras crianças com quem brincar e tudo era muito tranquilo. Vestia-me com as roupas da minha tia e imitava-lhe os movimentos para parecer  adulta. As penedas mais lisas serviam de  casa de bonecas. Uma boneca de trapos feita pela minha avó era a minha única companhia.  Amassava terra com água para fazer bolinhos e qualquer pedrinha circular servia de prato, sendo os móveis umas pedras maiores  com formatos diversos. Era tudo de “faz de conta”.
Mais tarde, após regressar das suas fazendas, a garotada juntava-se no largo da povoação e a tranquilidade que reinara na aldeia, durante a maior parte do dia, desaparecia como por encanto, dando lugar  a gritos e risadas estridentes,   que ecoavam alegremente pelas ruas e barrocas.
Então, as imagens começaram a desfilar na minha lembrança e pararam no Largo da Barroca no Sobral Magro. Lá apareceram todos os meus amigos de criança. Jogávamos "à  penamalha",  "à rolha",  ou "às escondidas".  Aproveitávamos  o lavadouro vazio, uma em cada canto e consegui ouvir a voz da  Hortensita gritar: " dá-me lume". Respondeu logo a saudosa Isabel: " vai àquela casa que te fume". E nós corríamos e gritávamos tentando trocar de canto, umas com as outras, sem sermos apanhadas. Eram as brincadeiras duma época em que não havia dinheiro para brinquedos mas, em que convívíamos e divertíamo-nos  muito com pequenas coisas. E, não éramos menos felizes...

 
Lá estava o "Coneca" encostado à parede duma casa, rindo e comentando as nossas brincadeiras com o seu modo de articular as palavras, para muitos impercetível. "Fó Mialu, fó. Aquê malano panha ti" (Foge Maria de Lurdes, foge. Aquele malandro apanha-te).
Tudo parecia tão real que, por momentos, me  pareceu ouvir o som da minha própria voz chamando: “Avó, avó!”.
Senti então uns bracitos que me envolveram carinhosamente e percebi que era a voz da Leonor que me chamava “Avó, avó! Que estás a fazer aí a olhar para a rua? Anda brincar comigo!”
 
Foto: Net

Obrigada pela sua visita. Volte sempre.
 


 

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